Como dar a grande notícia
Ainda restava algo a fazer antes de chorar, pular e se descabelar: encontrar uma forma de dar a notícia ao Homem-pai. Para isso, ela usou de toda a sua astúcia feminina. Comprou uma caixinha onde pôs: um par de sapatinho de tricô com os dizeres bordados "Sou do Papai", um livrinho com frases de paternidade cuja capa dizia "Parabéns, papai", um babador ("O babador é meu, papai, mas eu te empresto por nove meses"), um cartão de felicitações pelo bebê, cheio de declarações de amor dignas da mais comovente das telemensagens e um raio paralisante.
Mas seu instinto materno alertava: faltava algo ainda. Por isso ela bolou um plano mirabolante. Chegou em casa e disse ao Homem-pai que queria gravar uma mensagem natalina para a mãe (não especificou qual era a mãe, se a sua mãe ou ela própria). E o pobre Homem-Pai achou uma boa a idéia e empolgou-se a falar lindas palavras na frente da câmera. Quando pensava ter terminado seu discurso recebeu dela duas folhas de papel e um pedido: "agora leia essa mensagem!". E ele, ainda empolgado, sem desconfiar de nada, começou a ler:
"Você me mostrou a melhor parte de ter uma família,
Você me ensinou tanto que hoje é grande parte de tudo que sou,
Você me tornou uma pessoa melhor, mais bonita, mais feliz,
Você alimentou e tornou reais meus melhores sonhos,
E me apontou outros sonhos incríveis, que eu não teria se não fosse você.
Você caminhou comigo, me apoiando na tristeza e iluminando minha alegria.
Você hoje é o meu motivo mais forte de agradecer a Deus porque..."
E ao virar a folha para continuar a ler a mensagem, ele se deparou com uma folha estranha, com um código estranho, que lhe era totalmente desconhecido e que dizia algo indecifrável, esquisito. Que código seria aquele? Que tipo de mensagem natalina teria escondida ali por trás?
Com toda a força dos seus super-poderes de Homem-pai ele usou sua visão alfa-gama-beta para perceber que em cima da folha havia um timbre de laboratório de análises clínicas. Não quis crer que sua esposa escreveria uma mensagem de natal no próprio exame de fezes. Continuou lendo letra por letra e viu alguns números e letras mais estranhas ainda, algo como HCG... ou era com J? Dosagem... eletroquimioluminiscência (não, não podia ser exame de fezes), PCR, fetal... espere! Suas ondas cerebrais super-poderosas captaram uma frase escrita à caneta logo abaixo do estranho código que podiam decifrar o mistério.
“.... Nós vamos ter um filho! Parabéns!!!”
e mais esta:
Tô chegando, pai!
por Silvia Schmidt
“Pai, desde que fui semeada aqui, minha vida não tem sido nada ruim. No começo eu fui tomando forma, depois fui crescendo, crescendo, e agora já pareço uma cópia (meio achatadinha) de você.
Pai, como tem água aqui! Antes de sair, quero lhe dizer que não estou com medo. Alguns anjinhos me contaram que vou morar num lugar apelidado de "Planeta Água". Então, acho que não vou estranhar muito.
Quero avisá-lo que na hora em que eu sair, vou abrir um berreiro daqueles, tá? Afinal, já sei que vou dar de cara com um baita espaço e muita gente estranha em volta de mim. Mas logo vou me acalmar, porque vou reconhecer a sua voz e a da mamãe. Depois você vai me aconchegar no seu colinho, todo orgulhoso, e vou me sentir segura de novo.
No começo vou dar um pouquinho de trabalho. Até eu me habituar, muitas vezes vou acordá-lo com meu chorinho por causa de fome, dorzinhas de barriga, de ouvido, resfriadinhos e aquelas coisas próprias de gente muito pequena.
Ah! E não fique com ciúme da mamãe, viu? Por algum tempo ela deixará você meio em segundo plano, pois estará por demais ocupada com a grande novidade chamada EU. Isso não quer dizer que o amor dela por você terá diminuído. Vocês poderão namorar quando eu conseguir dormir por mais tempo.
Na continuação, tudo irá se ajeitando; o amor que teremos um pelo outro aumentará cada vez mais e, um belo dia, você se verá encomendando uma correntinha com um pingente de ouro incrustado com meu primeiro dentinho de leite. Isso sem falar nas minhas botinhas, que você levará penduradas no espelho retrovisor do carro!
Mais adiante irei para a escola, e vou cantar para você em todas as festinhas de Dia dos Pais. Nos finais de semana brincaremos e viajaremos juntos e, finalmente, um dia estarei crescida, talvez do seu tamanho.
Lembrarei com saudade dos maravilhosos momentos que teremos passado juntos na minha infância e, em todos os meus aniversários, lhe darei mais um daqueles emocionados abraços, dizendo: ‘Segura mais esse, pai! Filho criado é trabalho dobrado!’
Se prepara... Tô chegando, pai!”.